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Autor: Ascom Adufg-Sindicato
Publicado em 03/07/2020 - Notícias
ARTIGO: Um debate necessário: educação remota de emergência na UFG
Artigo escrito pelo professor Alexandre Aguiar dos Santos

O professor Alexandre Aguiar dos Santos divulgou um artigo que trata do debate sobre a retomada de atividades universitárias. Confira:
Este ensaio preliminar tem a finalidade de contribuir para o debate sobre a retomada de atividades de ensino da UFG em meio a pandemia. Considero importante refletirmos sobre o trabalho docente nesta conjuntura, tratando de alguns temas gerais e buscando articular posições políticas elementares de defesa da universidade pública gratuita e de qualidade, com a adoção de medidas práticas e seguras diante da crise que enfrentamos.
A pandemia do covid-19 está no seu ponto mais alto, e infelizmente ainda acelerando. Após mais de 110 dias da suspensão do calendário estamos em meio a um debate nas instâncias da UFG que projeta a retomada do semestre por meio de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDIC. O ministério da educação, seguindo a lógica de destruição deste governo, apresenta medidas que preveem inclusive a adoção de protocolos sanitários para a retomada de atividades presenciais.
Uma síntese do contexto conjuntural da educação superior é fundamental para atuarmos de forma coerente neste momento complexo (repleto de variáveis e tendências contraditórias). Destaco que este período é marcado pelo golpe de 2016 e das medidas de ataque aos direitos sociais, visando a destruição dos fundamentos institucionais decorrentes da constituição de 1988. Os ataques a universidade pública e aos serviços públicos foram e permanecem como agenda principal deste “governo”, ou melhor, pandemônio.
A resistência histórica de defesa da universidade esteve presente neste período, buscando mobilizar os docentes e impedir o desmonte da educação (lutas contra o golpe, contra a emenda constitucional 95, contra os cortes no orçamento etc.). Importante registar que setores minoritários da UFG endossaram estes ataques, inclusive do atual “regime”. Contudo, é forçoso reconhecer que não atingimos os objetivos de mobilização e ação necessários... passados mais de 4 anos do Golpe as Universidades Brasileiras vivem a pior conjuntura das últimas décadas... O combate ao conhecimento científico e a difamação da vida acadêmica passaram a ser propagandeados pelos mais altos cargos da moribunda república da constituição de 1988 (com o golpe de 2016 a carta constitucional de 1988 foi condenada a extinção, processo este que tem se acelerado com o pandemônio). Na UFG, esta ofensiva é explicitada no início deste semestre, quando uma professora da Faculdade de Educação passa a ser alvo da ofensiva protofascista, isso porque ela ousou falar a verdade em uma formatura. Nesta semana foi nosso colega do ICB, sofrendo ataques dos setores mais reacionários da sociedade, que põem a vida abaixo da mercadoria; estimulam o negacionismo da ciência e constroem uma política anticientífica. Estes são apenas dois exemplos, em uma infinidade de situações semelhantes que envolvem a comunidade acadêmica.
O momento exige unidade do conjunto da comunidade universitária, essa unidade precisa ser forjada por meio de um amplo debate, que contextualize a nossa UFG na atual quadra da história nacional. Será um equívoco político, de dimensões catastróficas, imaginar que a resposta a emergência causada pela pandemia ocorrerá sem estar solidamente articulada com uma resposta estratégica diante do cenário de ataques a universidade pública. Trata-se da velha máxima, em que o sujeito enxerga apenas a arvore a sua frente, mas não consegue ver o bosque que a cerca. Ou seja, a adoção de medidas emergenciais precisa ser combinada com a necessária defesa da Educação Pública em sentido amplo, e da Universidade especificamente, pois o que está em xeque não é apenas um ou dois semestres letivos, mas a instituição universitária como ela foi forjada nos últimos 30 anos.
Para tentar ser didático, precisamos responder coletivamente em duas frentes: 1) da defesa da educação pública gratuita e de qualidade, em especial da defesa das IFES (Instituições Federais de Ensino Superior); e 2) políticas emergenciais frente a pandemia.
A UFG precisa mobilizar suas forças para retomar a defesa das IFES como ação política organizada da comunidade contemplando, ao menos, os seguintes eixos gerais: Revogação da Emenda Constitucional 95; Em defesa de um orçamento suplementar emergencial para combater os efeitos da pandemia; Constituição de plano emergencial de rede pública de acesso à internet e inclusão digital; extensão do auxílio emergencial (R$600,00) para @s estudantes com renda per capita familiar até R$3.000,00; reversão (revogação) das políticas educacionais decorrentes do golpe de 2016 (BNCC, Ensino Médio, etc...); Garantia de eleições de dirigentes pela comunidade (fim da lista tríplice); Execução orçamentária impositiva para impedir contingenciamentos nas áreas de saúde e educação; restaurar e ampliar os orçamentos dos órgão de fomento à pesquisa, desenvolvimento científico e tecnológico, com a retomada de programas estratégicos como o ciência sem fronteiras entre outros...
No plano imediato sobre o enfrentamento da pandemia e as possibilidades de atividades de ensino remotas é relevante percebermos que as medidas governamentais estão se orientando para uma retomada de semestre sem o necessário planejamento e organização prévia.
Neste sentido, dentro da universidade existe um verdadeiro clima de pânico sobre o que fazer, e como fazer e a busca frenética de respostas rápidas para a situação. Resoluções são apresentadas “da noite para o dia” sem que existam condições objetivas de diálogo entre a comunidade. Tal situação tem levado ao aumento de tensões internas e a constituição de um ambiente desgastante para todas e todos. Continuar pelo atual caminho representa um grave risco para a adoção de medidas emergências adequadas. Ainda mais se consideramos que as pressões do MEC serão enormes, para que a partir do próximo mês as IFES retomem as atividades remotamente e presencialmente (com a adoção de protocolos sanitários).
Não podemos ter a ilusão, sobre a tendência posta em movimento, da provável retomada do semestre de 2020.1 em agosto próximo. A questão é como vamos fazer isso? Quais as condições que possuímos para responder a tal possibilidade?
Para o MEC, quando os estudantes com renda per capta de até meio salário mínimo começarem a receber os pacotes de dados, a serem licitados na primeira quinzena de julho, será o momento em que as IFES deverão retomar o semestre. Contudo, para a comunidade acadêmica, esta situação está longe de responder as necessidades básicas para a retomada emergencial do semestre. A complexidade deste momento precisa ser analisada para ser respondida de maneira satisfatória.
Vejamos algumas situações que já presenciamos: 1) Docentes, técnicos administrativos e discentes que não possuem equipamentos (computadores, acesso à internet etc.) adequados para atividades remotas; 2) Docentes, técnicos administrativos e discentes que não possuem ambiente doméstico propício para atividades remotas; 3) número de discentes por docente em atividades remotas; 5) Docentes, técnicos administrativos e discentes que em função da pandemia necessitam ficar em isolamento por serem vulneráveis ou coabitarem com pessoas vulneráveis, que implica em cuidados domésticos específicos limitando a possibilidade de interação remota; 6) adequação de estrutura curricular presencial para os meios remotos, não apenas nas disciplinas teórico cognitivas como nas práticas (Parecer CNE nº 5); 7) Docentes, técnicos administrativos e discentes que não possuem treinamento devido (uso das TDIC, didática e pedagógica) para atividades remotas; 8) evasão decorrente da exclusão digital; entre outras tantas variáveis.
A ausência do equacionamento dessas variáveis poderá ser catastrófica para o desempenho das atividades remotas. Realizar a antecipação do cenário a ser enfrentado é essencial para responder com responsabilidade os desafios postos. A adesão cega ao ensino remoto de emergência será gravemente prejudicial se não houver planejamento para responder as principais limitações evidentes à nossas condições de trabalho.
Outro leque de questões que está vinculado a situação de saúde em tempos de trabalho remoto é o aumento do adoecimento psicológico decorrente da situação de isolamento. As questões vinculadas a avaliação de desempenho também precisam ser enfrentadas, os parâmetros em período emergencial precisam ser adotados. Neste sentido é urgente que a adoção de processo de avaliação de desempenho reconheça que, neste período excepcional, a melhor postura é a adoção automatizada dos processos, a partir das atividades registradas nos relatórios de atividade docente, sem a imposição de metas mínimas, em face das profundas desigualdades enfrentadas neste período emergencial.
A problematização desta situação que estamos vivenciando necessita de respostas coletivas, não podemos imaginar que a administração sozinha será capaz de levar a cabo tal processo, isso porque, como evidenciei no início desse ensaio de reflexões, existem questões mais amplas que precisam ser articuladas com as respostas imediatas. A organização de um Congresso Universitário, com o tema da “Educação em Tempos de Pandemia e Pandemônio”, pode ser uma alternativa para democratizar o debate e buscar uma construção coletiva de respostas. Construir um Congresso que conte com a representação de delegados por unidades acadêmicas e estruturado por temas para abordar a atual situação pode ser o princípio de construção de uma força de ação capaz de responder aos desafios postos.
Autor: Alexandre Aguiar dos Santos